Eventos Acadêmicos de Turismo

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

EDUCAÇÃO E INTERPRETAÇÃO AMBIENTAIS NO ÂMBITO DA APA DO MORRO DO URUBU

EDUCAÇÃO E INTERPRETAÇÃO AMBIENTAIS NO ÂMBITO DA APA DO MORRO DO URUBU: A IMPORTÂNCIA DA REQUALIFICAÇÃO ESPACIAL PARA A PERFORMANCE AMBIENTALMENTE RESPONSÁVEL*

*Artigo publicado nos Anais do I Seminário de Turismo e Geografia: abordagens teórico-metodológicas interdisciplinares. UFS - Campus São Cristóvão - SE, 01 A 03 de dezembro de 2010, p. 836-850

Cleber dos Santos Costa[1]

Emanuela Maiara Pereira dos Anjos[2]

Isabelle Sayane Santana da Silva[3]

Rafaelle Camilla dos Santos Pinheiro[4]

Resumo

No processo de desenvolvimento de atividades de Educação Ambiental, as Áreas Naturais Protegidas (ANP’s) vem ganhando notoriedade, representando um espaço privilegiado para a difusão de comportamentos ambientalmente responsáveis. Consideradas como escolas ao ar livre, estes territórios, quando devidamente estruturados, possibilitam a compreensão para a importância do meio ambiente natural, bem como uma sensibilização face aos impactos negativos decorrentes das performances antropocêntricas sobre a natureza. Assim, torna-se de grande importância, para pesquisadores e/ou educadores o uso destes espaços para alcançar os objetivos da Educação Ambiental. Portanto, o presente trabalho tem como objetivo abordar o tema da Educação Ambiental na Área de Proteção Ambiental (APA) do Morro do Urubu, localizada na cidade de Aracaju. De modo específico, realiza-se uma análise sobre a importância do desenvolvimento das ferramentas de Interpretação Ambiental, através de técnicas ecológicas e instrumentos que se adéquem ao meio e aos seus visitantes, proporcionando aos indivíduos a aproximação e compreensão da área. A metodologia foi estruturada através de pesquisas bibliográficas e observações assistemáticas de campo. Conclui-se que existe uma necessidade de requalificação das infraestruturas existentes no Parque de modo que a educação e interpretação ambientais protagonizem o papel fundamental de mudança comportamental nos seus frequentadores frente ao meio ambiente e ampliem a satisfação da experiência da visitação.

Palavras-chave: Área Natural Protegida; ecoturismo; educação ambiental, experiência da visita

Abstract

In the process of developing environmental education activities, the Natural Protected Areas (NPA's) is being recognized as an important place for diffusion the environmentally responsible behavior. Deemed as outdoor schools, these territories, when properly structured, allow the understanding about the importance of natural environment as well as an awareness against the negative impacts of the anthropocentric performances over the envorinment. Thus, it is of great importance for researchers and / or educators to use these spaces to achieve the goals of environmental education. Therefore, this paper aims to address the issue of Environmental Education in “Area de Proteção Ambiental” of “Morro do Urubu”, located in the city of Aracaju. Specifically, we make an analysis on the importance of developing tools for Environmental Interpretation, using ecological techniques and means which are appropriate both the environment and the visitors, offering for then the approach and the right understanding of the area. The methodology was structured through documentary research and non-systematic observations of the field. We conclude that there is a need for upgrading the existing facilities in this Park so that the environmental education and interpretation can perform the role of change behaviors in its public and enhance the satisfaction on the visit experience.

Keywords: Natural Protected Área; ecotourism, enviromental education; visit experience

Introdução

O surgimento do Turismo trouxe a perspectiva de uma atividade considerada uma “indústria sem chaminé”. Ao longo da evolução do turismo, foi percebido que o turismo, como qualquer atividade econômica, causa impactos negativos ao meio ambiente. Assim, após estas evidências, surgiu uma nova forma de utilização dos espaços naturais que se popularizou através do termo Ecoturismo. Tal forma de turismo diferencia-se dos outros tipos de Turismo de Natureza, dentre outros aspectos, pelo fato de utilizar de ferramentas como Educação Ambiental e Interpretações do Meio Ambiente que facilitam a aproximação dos visitantes com o lugar visitado. Nesse caso, uma Área Natural Protegida (ANP) ou Unidade de Conservação (UC) são normalmente dotados de uma infraestrutura que facilita a interação do homem com o meio ambiente, sendo que muitas vezes toda essa potencialidade não seja tão bem utilizada.

O presente trabalho tem como objetivo a apresentação da Unidade de Conservação do tipo Área de Proteção Ambiental (APA) do Morro do Urubu como um equipamento de lazer e um atrativo turístico da cidade de Aracaju. A área possui um grande potencial para o desenvolvimento de programas de educação ambiental, utilizando-se de seus recursos naturais através de técnicas de interpretação ambiental para atender o fluxo de visitantes.

Durante a pesquisa foram utilizados os seguintes procedimentos metodológicos: pesquisa bibliográfica referentes às conceituações e premissas sobre os temas de Educação Ambiental, Ecoturismo, Turismo e Meio Ambiente, Interpretação Ambiental e as informação referentes a APA e; a pesquisa de campo essencial para as considerações expostas, pois, através das visitas ao local, pode-se perceber a contextualização teórico-prática sobre o tema abordado.

Diante destas pesquisas realizadas notou-se a importância da APA do Morro do Urubu como um meio de lazer para a população em geral, bem como a necessidade da implantação de um planejamento e de projetos que visem uma organização da visitação e melhoria da experiência que o contato com o meio ambiente do local pode proporcionar.

Turismo e Meio Ambiente

O turismo é um fenômeno mundial que se expandiu de forma expressiva após a Segunda Grande Guerra, onde houve um desenvolvimento dos meios tecnológicos, facilitando cada vez mais a atividade.

Dentre estes avanços, cumpre destacar o progresso nos meios de transportes, principalmente na aviação civil, onde a tecnologia, outrora empregue de forma bélica passou a ser usada em fins comerciais. As telecomunicações receberam vários aperfeiçoamentos, possibilitando ampla difusão de conhecimento e informações. A economia mundial cresceu e se diversificou e os indivíduos passaram a lutar pelos seus direitos trabalhistas, incluindo o direito as férias remuneradas. Todos esses fatores contribuíram para a expansão do turismo.

Dessa forma, o turismo passou a viver um momento de massificação e tornaram-se evidentes uma série de problemas com os impactos negativos ocasionados pelo número exorbitantes de visitantes nas mesmas épocas do ano aos destinos turísticos.

Esse crescimento desordenado começou a chamar atenção dos estudiosos da área e de grupos interdisciplinares, desencadeando manifestações e descontentamento com a situação do benefício do turismo para a economia, meio ambientes e sociedade. Devido a esses impactos negativos, começaram a surgir eventos pelo mundo todo para tentar minimizar toda essa situação.

Assim, em 1976 ocorreu em Washington, EUA, um seminário sobre impactos sociais e culturais do turismo. Já em 1980, houve uma conferência da OMT (Organização mundial do Turismo) em Manila, Filipinas, para mudança da direção do turismo. Em 1981 é estabelecida em Bangcoc, Tailândia, modelos de turismo alternativo do Terceiro Mundo. Em 1984, realiza-se um seminário sobre Turismo Alternativo na Ásia. Outro Encontro foi promovido pela Academia Internacional para Estudos do Turismo na Polônia em 1989. Ainda em 1989 realiza-se em Tamanrasset, Argélia, o seminário sobre Turismo Sustentável.

Todas essas discussões fizeram surgir um novo tipo de turismo que se opunha ao turismo de massa. A exigência dos visitantes passou a ser maior, principalmente quando passou a não querer apenas “espreguiçar-se em torno de uma piscina de hotel ou em participar de frenéticas visitas a pontos turísticos” (COLLINS, 1993, p.7) desta forma, o que o turista quer é um maior contado com a comunidade, participar ativamente e vivenciar realmente os locais visitados, surgindo assim um novo turista, o turista pós-moderno.

Seguindo essa nova forma de olhar do turista, as paisagens naturais com poucos sinais da ação humana passam a ser mais valorizadas pelo turismo pós-moderno. Dentre estas paisagens as Unidades de Conservação, que objetivam manter as áreas ambientais, utilizando-as para fins de um lazer consciente, ganham espaço em relação aos outros atrativos e destinos turísticos.

Unidade de Conservação

A origem das áreas naturais protegidas se deu com a criação do Parque Nacional de Yellowstone, nos Estados Unidos no ano de 1879. A criação deste parque teve como objetivo o uso recreativo e a preservação das belezas cênicas. No Brasil, a primeira unidade de conservação criada foi o Parque Nacional de Itatiaia, em 1927. Legalmente, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), instituído pela Lei Federal n° 9.985 de 18/07/2010, é responsável pelas normas para a criação, implementação e gestão das Unidades de Conservação no Brasil. O SNUC determina a divisão das unidades de conservação em dois grandes grupos: Unidades de Conservação de Proteção Integral e Unidades de Conservação de Uso Sustentável.

As Unidades de Conservação de Proteção Integral são representadas por estação ecológica, reserva biológica, parques nacionais, estaduais e municipais, monumento natural e refúgio da vida silvestre. As UC's pertencentes a esse grupo são destinadas a preservação da natureza e o uso parcial de seus recursos são de natureza indireta, tais como a aplicação de atividades e programas para estudos, pesquisas e Educação Ambiental.

O grupo das Unidades de Conservação de Uso Sustentável é caracterizado pelo uso direto de seus recursos naturais, assim é possível a existência de atividades humanas, mas estes devem seguir as premissas da sustentabilidade. O grupo é representado por: Área de Preservação Ambiental (APA), Floresta Nacional (FLONA), Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE), Reserva Extrativista, Reserva de Fauna, Reserva de Desenvolvimento Sustentável e Reserva Particular do Patrimônio Natural.

O turismo nas UC’s se apropria desse espaço através dos segmentos de turismo de natureza, turismo de aventura, turismo cultural e ecoturismo. Este último busca o desenvolvimento local nas três dimensões (social, econômica e ambiental) da sustentabilidade. Dentre os objetivos do Ecoturismo, está a Educação Ambiental, que através do contato das pessoas com essas áreas e de sua interpretação visa a conscientização dos indivíduos em relação ao meio ambiente.

Educação Ambiental

Na sociedade contemporânea, o ser humano dificilmente se considera um elemento da natureza, esse sentimento de distanciamento fundamentam as ações dos seres humanos, tidas como racionais e antropocêntricas (REIGOTA, 2006).

Nessa perspectiva antropocêntrica, iniciado pelas civilizações grego-romana e fortalecido pela Revolução Científica do sec. XVII, para o homem a natureza representa um estado de recursos ilimitados e disponíveis à sua satisfação e necessidades, tornando-se um alienado com relação à natureza (SOUZA, 2006).

O problema Ambiental não se trata apenas de garantir a preservação de determinadas espécies animais e vegetais e dos recursos naturais, mas devem-se considerar, prioritariamente, as relações econômicas e culturais entre a humanidade e a natureza e entre os homens (REIGOTA, 2006).

Dentro dessa vertente, a educação ambiental surge e se consolida no momento histórico no movimento ambiental e busca utopicamente desnaturalizar esse sentimento de distanciamento já enraizado na sociedade. A Educação ambiental pode ser entendida como:

[...] um processo de educação política que possibilita a aquisição de conhecimentos e habilidades, bem como a formação de atitudes que se transformam necessariamente em práticas de cidadania que garantem uma sociedade sustentável (JUNIOR; PELICIONI, 2002, p. 3)

A Educação Ambiental, como um processo de educação política a ser desenvolvida, necessita que suas atividades sejam continuas e descentralizadas, caracterizando-a não apenas pelos seus aspectos ligados à ecologia. Deste modo, as atividades devem ser permanentes e enfatizarem os aspectos econômicos, culturais, sociais, políticos e éticos, gerando novos valores nas relações homem-natureza e homem-homem.

Assim, a Educação Ambiental “reivindica e prepara os cidadãos para exigir justiça social, cidadania nacional e planetária autogestão e ética nas relações sociais e com a natureza” (REIGOTA, 2006, p. 10).

A abordagem da educação ambiental vem ganhando um enfoque múltiplo, surgindo uma nova e crescente presença de áreas e linhas de pesquisa nesse campo. Dentre as múltiplas áreas, o Turismo tem se mostrado como uma atividade e um fenômeno de fluxo de capital, pessoas e idéias que pode e deve ser tratado como um meio de valorização do meio socioambiental, e para tanto, pode incluir dentro de seu plano de desenvolvimento a educação ambiental.

As diversas abordagens da Educação Ambiental remetem a presença do relacionamento complexo entre as dimensões como economia e cultura, natureza e sociedade, bem-estar e utopia, meio ambiente e mudança cultural (RUSCHEINSKY, 2002). O turismo por ser um fenômeno social que se utiliza o meio natural, cultural e econômico para proporcionar o bem-estar dos atores envolvidos, bem como novas experiências através do contato com o diferente, se relaciona com a educação ambiental em suas complexas dimensões.

Ecoturismo e Educação Ambiental

O Ecoturismo, como uma alternativa do turismo de natureza de baixo impacto ambiental, busca conciliar a exploração turística com o meio ambiente de modo conservacionista, contribuindo para a sustentabilidade da região e o fortalecimento a consciência ecológica capaz de envolver a comunidade local e os turistas.

De acordo com as Diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo, publicada em 1994, o ecoturismo é um segmento da atividade turística que utiliza de forma sustentável o patrimônio natural e cultural, incentiva sua conservação e busca a formação de uma consciência ambientalista através da interpretação do ambiente, promovendo o bem-estar das populações.(EMBRATUR, 1994)

Assim, o Ecoturismo mesmo sendo uma atividade que cause impactos, utiliza estratégias para minimizá-los, sendo essas identificadas pelas políticas implícitas governamentais que passou a orientar suas práticas para a abrangência da Interpretação Ambiental e da Educação Ambiental que têm por objetivo desvelar atitudes e comportamentos inocentes e conservadores da natureza. Desse modo, para assegurar ao meio ambiente a valorização dos recursos naturais, o ecoturismo foi identificado como uma atividade facilitadora para a educação ambiental.

Educação Ambiental é um processo pelo qual os envolvidos participam ativamente no diagnóstico dos problemas ambientais e buscam soluções através do desenvolvimento de habilidades e formação de atitudes, adquirindo uma conduta ética condizente a cidadania. A mesma tem por objetivo mudar posturas sociais, comportamentos e hábitos, introduzindo-se na concepção de sociedade sustentável adotando os pressupostos das Conferências de Tbilisi e Moscou.

A Educação Ambiental é vista como um caráter educativo do ecoturismo que promove as ações educativas voltadas às atividades de proteção e melhoria socioambiental, potencializando a educação para mudanças culturais e sociais voltadas para a conservação do meio ambiente. Esse processo é desenvolvido por meio dos indivíduos e da coletividade que constrói valores, habilidades e competências essenciais à qualidade de vida e principalmente a sustentabilidade.

Os valores da Educação Ambiental promovem assim a conscientização e informação ao turista tendo como objetivo orientar a conduta nas áreas visitadas apoiando de maneira disciplinar os programas de manejo, conservação e sustentabilidade, difundindo uma consciência ecologicamente correta, considerando que a natureza é esgotável, por isso, deve ser utilizada de maneira racional.

Segundo Leonardi (1999), a educação ambiental pode ser classificada em: formal, informal e não formal. A Educação Formal é um sistema educativo que se realiza através das instituições de ensino por meio dos cursos, tendo como função construir a cidadania ecológica, agindo sobre a comunidade de forma teórica. Já a Educação Informal é um processo que se desenvolve a partir de acontecimentos, encontros e leituras realizadas nos tempos livres.

Por fim, a Educação Ambiental não formal também denominada de educação ao ar livre, é um conjunto de ações e práticas que visa à sensibilização, organização, mobilização e participação da coletividade na defesa da qualidade do meio ambiente incentivada pelo poder público através do ecoturismo.

As práticas de Educação Ambiental não formal são compostas pelas modalidades: aprendizado sequencial, tendo como objetivo proporcionar mudanças de comportamento e valores aprofundando a interação humana com a natureza; interpretação ambiental que fornece informações realçando a história e as características culturais e ambientais do lugar acrescentando valor a experiência do visitante; e a educação experiencial, sendo um dos primeiros programas de educação ao ar livre, utiliza o ambiente natural, enquanto pedagógico, servindo para a interação do homem com a natureza fazendo com que o mesmo se desenvolva através de suas experiências e reflexões transformadoras.

A Educação Ambiental objetiva minimizar os impactos negativos provocados pelo ecoturismo, ensinando a sociedade como agir perante a natureza. Assim, a união entre ecoturismo e educação ambiental promove a conservação do meio ambiente através das modalidades de educação ambiental não formal, compreendendo nos benefícios estimulados pelas experiências do indivíduo.

A Educação Ambiental é possível em diversos contextos, sendo que ela deve estar presente em todos os espaços que se educam os cidadãos. Assim, ela pode ser desenvolvida nas escolas, nos parques, nas reservas ecológicas, nas associações de bairro, sindicatos, universidades, meios de comunicação de massa e etc.

As metodologias de educação ambiental terão as suas especificidades e características, dependendo do educador, do educando e do contexto social, ambiental e cultural. Os programas de educação ambiental em Unidades de Conservação como também em Áreas Naturais Protegidas, vêm sendo amplamente utilizadas através do Ecoturismo.

A Interpretação como uma Ferramenta da Educação Ambiental em APA’s

A prática sistemática da Interpretação Ambiental tem início nos finais dos anos cinqüenta nos EUA pelo Serviço Nacional de Parques. O norte-americano Freeman Tilden foi um dos pioneiros a falar e escrever um livro sobre a temática, e seus trabalhos objetivavam sensibilizar o crescente número de visitantes de dois parques norte-americanos sobre a importância de sua preservação (MURTA; GOODEY, 2005).

A interpretação busca a valorização do meio socioambiental e da experiência do visitante e usuários das áreas ambientais, pois esta possibilita uma melhor compreensão do lugar acrescentando valor à vivência. Segundo Tilden:

Interpretação ambiental é uma atividade educacional que objetiva revelar significados e relações através da utilização de objetivos originais, de experiências de primeira mão e por meio de mídia ilustrativa, ao invés de simplesmente comunicar informações factuais. (TILDEN, 1957, apud MURTA e GOODEY, 2005, p. 14).

Assim, a interpretação auxilia a percepção e entendimento do individuo do ambiente a sua volta, de uma forma que este, através dessa prática, possa não apenas observar, mas perceber o ambiente e sentir-se estimulado a colocar em uso tudo que foi passado durante sua experiência, sendo multiplicador do conhecimento adquirido.

A abordagem interpretativa deve se caracterizar por quatro aspectos essenciais: ser amena, de modo a entreter e manter a atenção do turista; ser pertinente, ou seja, ter significado e despertar o interesse pessoal; ser organizada, com ordenamento lógico das idéias expostas e; ser temática, quer dizer, ter um tema explicitado que se pretende comunicar (VASCONCELOS, 2003).

Sendo assim, a interpretação deve ser organizada, de forma a não cansar o visitante e mantê-lo focado nas explicações sem fazer nenhum tipo de pressão durante a visita, tornando a experiência prazerosa e informativa ao mesmo tempo. Fixando toda aprendizagem adquirida durante o percurso, fazendo com que o visitante possa utilizar essas informações tanto durante como após a visita.

Existem várias técnicas para se utilizar a interpretação ambiental para o desenvolvimento da educação ambiental, tais como: centro de visitantes, publicações, excursões guiadas e trilhas autoguiadas. Essas técnicas têm como objetivo facilitar o entendimento do visitante em relação ao local, estimulando-o a estabelecer uma relação mais próxima com ambiente visitado.

O Centro de Visitantes é um espaço que tem por objetivo expor e exibir informações educativas através de vídeos, mapas, folhetos explicativos, diagramas entre outros métodos de forma a deixar o visitante ciente sobre tudo no lugar visitado.

As Publicações, em mídia impressa e digital, apresentam-se como alternativas bastante viáveis por serem meios relativamente mais baratos e com poder de atingir um publico de maior proporção, porém o objetivo desta é a informação e não a interpretação direta.

A Excursão Guiada é uma técnica interpretativa muito eficaz e de fundamental importância. Por conseguir manter um contato direto com o visitante, ela evita que o mesmo tenha práticas inadequadas no local e o estimula a participar das atividades de forma interativa. Para esse tipo de pratica é necessário um guia para acompanhar toda a visita. Um dos pontos fortes dessa técnica é que o guia pode se adequar aos tipos de visitantes, porém existem algumas limitações, o visitante pode sentir-se incomodado com a presença do guia e achar que existe uma interferência em relação ao seu senso de liberdade, podendo restringir a sua interpretação do ambiente, além de ser menos viável economicamente.

As trilhas, como meio de interpretação ambiental, tem como objetivo, além da transmissão de conhecimento, propiciar que o indivíduo revele os significados e as características do ambiente utilizando-se de elementos originais, experiências diretas e meios ilustrativos, apresentando-se como uma ferramenta básica para os programas de educação ambiental.

Assim, as trilhas constituem um instrumento pedagógico importante, pois permite que as áreas naturais se tornem equipamentos que viabilizam uma educação ambiental de não informal. Essa liberdade proporcionada pelas trilhas disponibiliza um “laboratório vivo”, que estimulam a curiosidade e, consequentemente, o interesse dos indivíduos a conhecerem os recursos naturais, diferenciando-se da forma tradicional de educação.

Resultados: o potencial da APA DO Morro do Urubu para a implantação de técnicas de interpretação ambiental

Localizada na zona norte da cidade de Aracaju, a Área de Proteção Ambiental Morro do Urubu é uma unidade de conservação de uso sustentável pelos seus atributos bióticos, abióticos, estéticos e importância que esta representa para a qualidade de vida e bem-estar dos residentes e visitantes da cidade de Aracaju.

Dentro das categorias de UC, a Área de Proteção Ambiental (APA) é um ambiente que pode dispor de recursos que auxiliem a educação ambiental por meio da interpretação ambiental.[5]

De acordo com os objetivos de uma APA, que são estabelecidos pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservação, a APA do Morro do Urubu foi criada com o objetivo de proteção a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade no uso dos recursos naturais que essa área dispõe.

Assim, como o único remanescente de Mata Atlântica de Aracaju, numa área de 213,8724 hectares, a APA do Morro do Urubu se tornou uma unidade de conservação através do decreto n° 13.713, de 14 de junho de 1993, sua área de influencia direta compreende o morro e os bairros Porto Dantas, Industrial e Coqueiral. Apresenta-se como uma área muito importante em diversos âmbitos, tanto para a elaboração de pesquisas tanto para o lazer.

A área que compreende o Parque Estadual José Rolembergue Leite (Parque da Cidade), ocupa 93 hectares da APA. A gestão da Área de Proteção do Morro do Urubu é feita pela Administração Estadual do Meio Ambiente (ADEMA), já o Parque da Cidade é administrado pelo Departamento de Desenvolvimento Agropecuário de Sergipe.

Por dispor de um parque, zoológico, estrutura de apoio (restaurante, lojas, biblioteca, recepção), centro hípico, teleférico, mirante e atrativos naturais, a APA do Morro do Urubu apresenta-se como um espaço que dispõe de equipamento de lazer para residentes e visitantes de Aracaju, além de se apresentar como um local onde é possível desenvolver estudos e atividades voltadas às diversas áreas das ciências humanas, sociais, exatas e biológicas.

O Parque da Cidade, criado em 1979, antes da criação da APA, é uma área que apresenta um desgaste ambiental mais visível, em termos de presença de infraestrutura e desmatamento. Tal característica possibilita a realização de piqueniques, caminhadas, prática de esportes), ou seja, é uma área que pode ser utilizada para atividades voltadas aos usuários que não tenham muita disposição a um maior nível de contato com a natureza.

A interpretação ambiental na APA pode ser desenvolvida de várias formas, a partir da requalificação da infraestrutura já existente. No zoológico, onde é possível observar animais em extinção, as placas informativas nas jaulas podem servir como um meio de interpretação e conscientização ambiental, quando estas são de caráter ilustrativo e tentam passar informações sobre a importância desses animais na natureza, bem como a ameaças que os mesmos sofrem pelas ações que os humanos cometem, direta ou indiretamente. Além das placas nas jaulas, é possível a implantação de coletores seletivos de lixo nas passarelas do zoológico.

O prédio na entrada do zoológico, onde se localiza a administração do parque, conta com uma biblioteca, uma loja e uma sala de vídeo, estes espaços são de extrema importância para a interpretação e atividades de educação ambiental. Mas desde a sua inauguração, no ano de 2006, esta estrutura continua sem uso, estrutura que deveria servir para a população local, tanto da educação ambiental como em projetos socioambientais que visem o envolvimento da comunidade do entorno com a APA, objetivando o desenvolvimento local.

Além do zoológico, outras instalações poderiam ser meio de interpretação ambiental, como o espaço de espera do teleférico, o mirante e trilhas que podem ser desenvolvidas no local. Os recursos naturais da APA, caracterizados por uma biodiversidade da Mata Atlântica e vegetação típica dos ecossistemas manguezal e cerrado, tornam a área um local propício para o desenvolvimento de trilhas ecológicas interpretativas, mas, apesar de possuir esse potencial, ainda não são desenvolvidas “oficialmente” trilhas na área.

Sobre os Usos na APA do Morro do Urubu

Através das pesquisas realizadas em campo, pode-se perceber que o fluxo de visitantes na APA é bem elevado durante os feriados e finais de semana, é evidente também a forte presença do comercio informal, representado, em sua maioria, pelos vendedores de alimentos e bebidas que começaram a surgir para atender a elevada demanda por esses serviços.

Os principais frequentadores são moradores dos bairros circunvizinhos a APA localizados na zona norte de Aracaju. Dentre os equipamentos existentes, o mais utilizado é o zoológico, que possui um espaço físico abrangente, propiciando lazer aos visitantes. Já o teleférico, apesar de possuir uma boa estrutura, tem seu acesso limitado, por possuir uma taxa de uso, o que acaba gerando uma segregação social dentro do parque. As pessoas que visitam o teleférico são em sua maioria turistas e indivíduos de poder aquisitivo maior, enquanto que no zoológico, em que o acesso é gratuito, existe um número maior de moradores locais.

Essa ocupação se dá de forma desordenada, resultado da falta de uma política interna da APA e do Parque (códigos de conduta para visitantes) que discipline e fiscalize os usos desse equipamento. Observou-se na pesquisa de campo a falta ou até mesmo a ineficácia da fiscalização na APA, a exemplo do zoológico, onde as pessoas ultrapassavam as barras de proteção das jaulas dos animais, alimentava os bichos, armavam redes nas árvores, jogavam lixo nos recintos e utilizavam sons de carro provocando uma poluição sonora, causando impactos negativos para os animais.

Durante as visitas foi notado que o fluxo nos feriados e finais de semana no Parque é muito alto em relação a sua capacidade, assim a circulação e utilização do local tornam-se difíceis, tais fatores aliados à inexistência de um sistema de sinalização e objetos de interpretação ambiental que se adequem ao local comprometem o valor da experiência que a área pode proporcionar.

Atualmente, as pessoas que desejam conhecer um pouco mais sobre a APA e sobre seus recursos naturais, remanescente da Mata Atlântica, são obrigadas a percorrer as vias de acesso já existentes, tais vias são representadas por uma pista que também é utilizada pelos veículos automobilísticos, tais como carros, ônibus e motocicletas.

Um problema evidente nessa via de acesso é a falta de espaço destinado para pedestres, assim, o visitante que resolver conhecer o local tem que se aventurar em meio aos condutores dos veículos que, em sua maioria, desrespeitam o limite de velocidade imposto pela sinalização existente (30Km/h). Além desse desrespeito por parte dos condutores, outro fator é a inexistência de fiscalização e o pouco policiamento da APA.

Considerações Finais

Diante das pesquisas realizadas para elaboração do presente trabalho, foram percebidos aspectos positivos e negativos em relação a atual utilização da APA do Morro do Urubu como objeto de lazer. Dentre os aspectos positivos encontram-se o espaço do Parque, que possui uma grande potencialidade para o desenvolvimento de atividades relacionadas ao meio ambiente, notadamente o remanescente de Mata Atlântica pertencente a APA.

Já os aspectos negativos estariam relacionados à forma de utilização do Parque, onde há a falta de um código de conduta para visitação. A administração e fiscalização não estão presentes e não funcionam durante os feriados e finais de semana, ocasionando diversos problemas devido ao aumento do fluxo durante esses períodos. Outro problema encontrado na área foi a inutilização de prédios (centro, restaurante, biblioteca e loja) que deveriam ser utilizados para a melhoria da infraestrutura de apoio do Parque. Percebe-se, dessa forma, a veemente necessidade de requalificação dos espaços destinados aos visitantes da APA no sentido de oportunizar ao público a mensagem do comportamento ambientalmente responsável e uma melhor compreensão sobre o espaço visitado.

Assim, depreende-se quanto a necessidade de projetos e planejamentos que objetivem uma melhor organização da APA, proporcionando assim, uma melhoria na qualidade do espaço, disponibilizando uma melhor experiência aos seus visitantes e usuários. Dentro desses projetos e planejamentos, tendo em vista a grande demanda que a área recebe, deve-se utilizar da interpretação ambiental como ferramenta para sensibilizar e conscientizar, de forma a mudar as atitudes dos seus frequentadores.

Referências Bibliográficas

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BUENO, F.P.; PIRES, P.S.. Ecoturismo e educação ambiental: possibilidades e potencialidades de conservação da natureza. Disponível em:<http://www.ucs.br/ucs/tplSemMenus/posgraduacao/strictosensu/turismo/seminarios/arquivos_4_seminario/GT08-5.pdf>. Acesso em: 20 set. 2010.

JESUS, J.S; SELVA, V.F. Estudo Comparativo do Uso de Trilhas Interpretativas nos Parques Nacionais de Ubajará, Ceará e Sete Cidades, Piauí. Disponível em: <http://www.scribd.com/doc/11567206/ESTUDO-COMPARATIVO-DO-USO-DE-TRILHAS-INTERPRETATIVAS-NOS-PARQUES-NACIONAIS-DE-UBAJARA-CEARA-E-SETE-CIDADES>. Acesso em: 15 set. 2010.

JUNIOR A. P, PELICIONI M. C. Educação Ambiental: desenvolvimento de cursos e projetos. São Paulo: Universidade de São Paulo, 2002.

LEONARDI, M. L. A. A educação ambiental como um dos instrumentos de superação da insustentabilidade da sociedade atual. In: CAVALCANTI, C. (Org.). Desenvolvimento e natureza: Estudos para uma sociedade sustentável..ed. São Paulo: Cortez; Recife: Fund. Joaquim Nabuco, 1999, p. 391-408.

Ministério do meio ambiente, Conselho Nacional do Meio Ambiente. Resoluções do CONAMA 1984 2008. Brasília: Conama, 2008.

NEIL, J; WEARING, S. Ecoturismo: Impactos, Possibilidades e Potencialidades. São Paulo: Manole, 2001.

PEDRINI, A.G.. Ecoturismo, interpretação e educação ambientais: consensuando conceitos. Disponível em: http://www.physis.org.br/ecouc/Artigos/Artigo66.pdf. Acesso em: 10 set. 2010.

REIGOTA, M. Educação Ambiental. São Paulo: Brasiliense, 2006.


[1] Acadêmico do curso de Geografia da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: clebinho.costa@gmail.com

[2] Acadêmica do curso de Turismo da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: manuanjo15@hotmail.com

[3] Acadêmica do curso de Turismo da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: isabelle.turismo@hotmail.com

[4] Acadêmica do curso de Turismo da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: pinhorafaelly@gmail.com

[5] Segundo a Resolução CONAMA n° 10, de 14 de dezembro de 1988: As Áreas de Proteção Ambiental- APA’s são unidades de conservação, destinadas a proteger e conservar a qualidade e os sistemas naturais existentes, visando a melhoria da qualidade de vida da população local e também objetivando a proteção dos ecossistemas naturais (Resolução CONAMA n° 10, de 14 de dezembro de 1988).

Gastronomia nos Mercados do Centro da Aracaju - SE


A GASTRONOMIA COMO ATRATIVO E PRODUTO PARA A DIVERSIFICAÇÃO DA OFERTA TURÍSTICA NO SEGMENTO DO TURISMO CULTURAL: MERCADOS DO CENTRO HISTÓRICO DE ARACAJU/SE*

*Artigo publicado nos Anais do I Seminário de Turismo e Geografia: abordagens teórico-metodológicas interdisciplinares. UFS - Campus São Cristóvão - SE, 01 A 03 de dezembro de 2010, p. 482-499

Geane Almeida Conceição[1]

Rafaelle Camilla dos Santos Pinheiro[2]

Cristiane Alcântara de Jesus Santos[3]

Resumo

Atualmente, a demanda turística encontra-se mais exigente em termos de qualidade e diversidade da oferta de bens e serviços nos destinos turísticos. Diante dessa realidade, a diversificação, qualificação e ampliação da oferta turística tornam-se imprescindíveis para a sobrevivência e consolidação dos destinos. O patrimônio cultural, pelo seu caráter único, apresenta-se como elemento que diversifica a oferta turística. Através do elo entre o patrimônio material e imaterial, o turismo cultural proporciona ao visitante uma experiência mais próxima do local visitado. Dentre os patrimônios que podem ser utilizados para e desenvolvimento do turismo cultural, os mercados municipais aliados a gastronomia são de grande importância para a atividade turística. Em Aracaju, os Mercados Centrais, com sua estrutura física, manifestações culturais e gastronômicas, retrata a identidade do sergipano. Tais características fazem dos Mercados Municipais um dos atrativos culturais da capital aracajuana. Partindo desse pressuposto, o objetivo deste artigo é analisar como os espaços dos mercados podem se configurar como um lugar, em que os turistas possam desfrutar de novas experiências. A fim de atingir os objetivos propostos foram realizados os seguintes procedimentos metodológicos: pesquisa bibliográfica, em que foram consultados artigos científicos e livros que versam sobre a temática em questão; e pesquisa de campo, a partir de visitas técnicas e observações in loco nos mercados, a fim de obter dados atualizados e reais sobre o objeto de pesquisa. Assim, os Mercados Centrais, pelos seus muitos aspectos materiais e imateriais, onde se incluem as manifestações gastronômicas, são lugares compostos de vida e de dinâmica que pode propiciar ao turista uma experiência gastronômica inesquecível. Com base na oferta potencial e real dos mercados torna-se de grande importância que estes sejam trabalhados de forma racional, proporcionando o desenvolvimento social e econômico dos agentes envolvidos e o bem-estar da população aracajuana e de seus visitantes.

Palavras-Chaves: Turismo cultural. Oferta turística. Mercados Municipais de Aracaju.

Abstract

Currently, tourism demand is more demanding in terms of quality and diversity of goods and services in tourist destinations. Given that reality, diversification, qualification and expansion of tourism become indispensable to the survival and consolidation of destination . Cultural heritage, its unique character, is presented as an element that is diversifying the tourism offer. Through the link between the tangible and intangible heritage, cultural tourism offers the visitor an experience closer to the place visited. Among the assets that can be used to develop cultural tourism, municipal markets coupled with food are really important for tourism. In Aracaju, the Central Markets, with your physical space, cultural events and gastronomy, portrays the identity of Sergipe. These characteristics make the Municipal Markets one of the most important cultural attractions of the capital Aracaju. Based on this assumption, the goal is to analyze how the spaces of markets can be configured as a place where tourists can enjoy new experiences. To achieve the proposed objectives were accomplished following methodology: literature, who were consulted in scientific articles and books that deal with the issue in question; and field research, from technical visits and observations in locus in the markets in order to obtain real and updated data on the object of research. This way, the Central Markets, for their many tangible and intangible aspects, which include culinary demonstrations, are places with life and dynamics that may provide the visitor an unforgettable gastronomic experience. Based on actual and potential supply markets becomes very important that working on a rational way, providing the social and economic development of the agents involved and well-be of the population and the city visitors.

Keywords: Cultural Tourism. Tourism Offer. Municipal Markets of Aracaju.

Introdução

Atualmente, a compreensão do patrimônio cultural não está relacionada somente aos bens aristocráticos, religiosos, estatais ou industriais, uma vez que inclui também os bens intangíveis. De acordo com Barreto (2000), a noção de patrimônio cultural é muito mais ampla e não inclui somente os bens tangíveis, mas também os intangíveis, as manifestações artísticas, o modo de fazer humano, sejam as representações da cultura das classes mais ricas ou as que representam a cultura dos menos favorecidos.

A inserção da cultura intangível, imaterial ou oral como um bem patrimonial se deu a partir da conferência geral da UNESCO no ano de 1989. Neste evento, a UNESCO define como cultura intangível,

O conjunto de criações que advém de uma comunidade cultural fundamentada na tradição, expressada por um grupo ou por indivíduos e que reconhecidamente respondem às expectativas da comunidade enquanto expressão de sua identidade cultural e social; as formas e os valores se transmitem oralmente, por imitação ou de outras maneiras. Suas formas compreendem, entre outras, a língua, literatura, música, dança, os jogos, a mitologia, os ritos, os costumes, o artesanato, a arquitetura e outras artes[4].

Posteriormente, a UNESCO adotou uma nova conceituação do patrimônio cultural intangível como,

as práticas e representações, juntamente com os conhecimentos, técnicas, instrumentos, objetos, artefatos e lugares necessários que as comunidades e os indivíduos reconheçam como patrimônio cultural imaterial próprio, e que sejam compatíveis com os princípios universais de direitos humanos, equidade, sustentabilidade e respeito mútuo entre as comunidades culturais. Este patrimônio cultural imaterial é constantemente recriado pelas comunidades em resposta ao seu entorno e suas condições históricas de existência, e inspira um sentimento de continuidade e identidade, promovendo assim a diversidade cultural e a criatividade humana[5].

A partir deste conceito podemos destacar dois pontos de fundamental importância: o primeiro se refere à existência de valores e costumes que são compartilhados em uma determinada sociedade; e o segundo ponto está relacionado com a possibilidade de difundir estes valores e costumes e de “deixar conhecer-se”, promovendo assim a diversidade cultural através do reconhecimento recíproco.

A cultura imaterial compõe o espaço através de temporalidades que, em muitos casos, fazem referência ao passado de uma forma presente. Assim, através da preservação da cultura imaterial, as sociedades mantêm seus costumes e hábitos para as novas gerações e possibilitam que outras sociedades a conheçam.

Como uma alternativa de alcançar o desenvolvimento local, vários destinos estão se especializando no turismo cultural, uma vez que a atual demanda do mercado turístico manifesta uma tendência crescente de buscar novos produtos que atendam a tríade ócio – prazer - enriquecimento cultural. Como afirma Santos (2010, p. 2),

As transformações na produção dos espaços turísticos, bem como na forma de consumo pelos turistas fizeram com que muitos gestores repensassem acerca da necessidade da diversificação da oferta turística, buscando aliar paisagens, histórias e cultura. Dessa forma, o patrimônio histórico e cultural de muitas cidades aparece como estratégia viável capaz de articular segmentos distintos na tentativa de consolidação de um destino, a partir da elaboração de produtos complementares.

A possibilidade de desenvolver novos produtos turísticos se converte em um complexo desafio, já que as ações não devem se basear somente no princípio de “inovar por inovar” sem levar em consideração as novas tendências do turismo que estão baseadas na segmentação e fragmentação. De fato, o desenvolvimento de novos produtos deve ter como objetivo atender a pluralidade da demanda.

Partindo desse pressuposto, este artigo tem como eixo central a combinação de recursos gastronômicos regionais, o legado cultural e os recursos paisagísticos de um dos atrativos mais importantes da cidade de Aracaju, capital do estado de Sergipe, os mercados centrais. Desta forma, o objetivo deste trabalho é analisar como os espaços dos mercados podem se configurar como um lugar, em que os turistas possam desfrutar de novas experiências.

A fim de atingir os objetivos propostos foram realizados os seguintes procedimentos metodológicos: pesquisa bibliográfica, em que foram consultados artigos científicos e livros que versam sobre a temática em questão; e pesquisa de campo, onde foram realizadas visitas aos mercados, a fim de obter dados atualizados e reais sobre o objeto de pesquisa através de observações in loco.

Patrimônio Histórico Cultural

A preocupação com o patrimônio resulta de uma transformação profunda nas sociedades modernas a partir do surgimento dos Estados nacionais (FUNARI; PELEGRINI, 2006).

O patrimônio expressa a identidade de um povo e, como conseqüência, este é dotado de diversidade por características humanas e ambientais a ele impregnadas. Cada nação possui dentro de seu território uma diversidade humana e ambiental expressa em seu patrimônio material e imaterial. O patrimônio, por sua diversidade e peculiaridades, é único e excepcional e, por isso, desperta o interesse à visitação e, como bem comum de uma coletividade, deve ser preservado.

Porém, vale ressaltar que há uma dificuldade de saber o que preservar e como preservar. Além disso, nota-se o enfoque dado à preservação de patrimônio material, sem levar em consideração o imaterial. De fato, no Brasil, o patrimônio cultural material é alvo de preocupações quanto a sua preservação e catalogação desde a década de 30, e, somente recebeu uma expressa referência na Constituição de 1988, que lhe definiu os elementos integrantes e estipulou mecanismos de sua proteção, conforme pode ser observado no seu artigo 216,

Artigo. 216 – Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à sociedade brasileira, nos quais se incluem:

I – as forma de expressão;

II – os modos de criar, fazer e viver;

III – as criações científicas, artísticas e tecnológicas;

IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais;

V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico e científico (CONSTITUIÇÃO FEDERAL DO BRASIL, 1988).

O artigo 216 da Constituição Federal do Brasil, além de ampliar o conceito de Patrimônio Cultural, impulsionou, mesmo que tardiamente, a criação do Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial, um novo instrumento de preservação implantado pelo decreto nº 3.551/2000[6].

Embora somente o registro em livros não garanta a sobrevivência dos bens culturais imateriais, pois este depende das transmissões através da sociabilidade para continuar existindo, o registro garante, via o decreto nº 3.551/2000[7], a preservação desse patrimônio.

Assim, dentre os objetivos adotados pelo “Programa Nacional do Patrimônio Imaterial”, as políticas de registro eram mais visadas que as de preservação, aspecto causado pela urgência em registrar o patrimônio cultural imaterial. Assim, a partir da “valorização desse patrimônio” surgiram políticas que visavam a sua exaltação enquanto um bem comum nacional e a sua preservação foi à conseqüência dessa valorização.

A cidade, em toda a sua complexidade, é um documento que retrata a vida e a identidade das pessoas que a constitui. Desse modo, as políticas de preservação dos bens culturais materiais e/ou imateriais devem levar em consideração todos os aspectos sociais, econômicos e ambientais que dela fazem parte, a fim de não produzir “bolhas” resultantes de vários projetos de restauração do patrimônio cultural material (FUNARI; PELEGRINI, 2006).

De fato, essa preocupação com a preservação do patrimônio vem crescendo em função da grande valorização mercadológica dos bens culturais. Atualmente, baseado em políticas de preservação do patrimônio cultural, as políticas de revitalização, para atrair os turistas, transformam paisagens históricas e manifestações culturais em meras alegorias para o turista ver, “bolhas” ou “simulacros”, “espetáculos”, minimizando seu valor simbólico em detrimento do consumo e do capital (AUGÉ, 1994; CRUZ, 2001).

Gastronomia como um Patrimônio Imaterial e Atrativo Turístico

A alimentação, mais que um ato biológico de fornecer substâncias essenciais ao corpo, e o alimento, mais que um objeto nutritivo do ato de se alimentar, é para cada sociedade significados e simbologias pertencentes as suas identidades (SCHLUTER, 2003). Tomando por base um alimento similar, diferentes culturas preparam sua alimentação de formas diversas, pois a preparação se adéqua aos códigos sociais, valores culturais, geografia e heranças genéticas de cada grupo social.

Assim, a gastronomia pode ser considerada como uma forma espontânea de expressão da estrutura de determinada sociedade ou grupo de indivíduos. É comum as sociedades utilizarem, para prepararem seus pratos, elementos produzidos na área onde se residem e que valorizam a afetividade e o valor simbólico.

A alimentação de um indivíduo possibilita diferenciar a que grupo e/ou sociedade ele pertence, assim como, a sua classe social. Desta forma, a alimentação pode atuar como um fator de diferenciação de determinada cultura, pois ao comer é incorporado não somente as características físicas dos alimentos, mas, sobretudo, seus valores simbólicos e imaginários. Dessa maneira, a comida não é boa apenas para comer, mas, sem dúvida, para pensar (SCHLUTER, 2003).

Embora exista uma carência de pesquisas que disponibilizem informações baseadas na experiência do turista em relação ao patrimônio, os grandes fluxos de turistas que se deslocam para destinos com grande valor histórico e cultural demonstram a importância do patrimônio para o turismo internacional. Exemplo disso são as catedrais, aldeias, castelos e gastronomia na Europa e a cultura e arquitetura presentes em Machu Picchu, lugares que recebem grandes fluxos de turistas e são conhecidos mundialmente pelo seu patrimônio (SCHLUTER, 2003).

Além do valor monumental, arquitetônico e artístico verificados nos lugares, os aspectos imateriais da cultura são muito importantes para a experiência turística. Tais aspectos tradicionais da cultura (as festas, a música, as danças e a gastronomia) ao incluir significados simbólicos que remetem à identidade de grupos culturais diferentes, fazem também parte do consumo turístico, seja isoladamente ou como complemento de outras atrações de maior importância.

As principais motivações dos viajantes encontram-se na busca pelo prazer da viagem e da alimentação. Assim, a gastronomia assume um papel de grande importância como um produto para o turismo cultural. Essa importância se dá através da busca pelas raízes culinárias e a forma de entender a cultura local do destino visitado por meio de sua gastronomia.

Além disso, a gastronomia e o turismo são inseparáveis, pois não podemos pensar em turismo sem o ato de se alimentar, mesmo sendo em curta ou longa duração da viagem ou, até mesmo a motivação para tal, haverá sempre a necessidade de alimentar-se e dessa forma experimentar a gastronomia do local visitado.

A cozinha tradicional passa a ser reconhecida cada vez mais como um valioso componente do patrimônio intangível dos povos. Estando o prato pronto, sua preparação e o significado para cada sociedade, estabelecem os aspectos que não se podem vê, mas que dão um caráter diferenciado (SCHLUTER, 2003).

Alguns locais com vocação para o turismo cultural podem incrementar seu produto turístico através da gastronomia e outros aspectos imateriais de sua cultura, como é o caso a cidade de São Cristóvão em Sergipe, quarta cidade mais antiga do Brasil, que possui um patrimônio reconhecido mundialmente pelo seu acervo arquitetônico e cultural. Esta cidade pode agregar um valor maior aos atrativos através da gastronomia, a exemplo da queijadinha que se configura como uma herança portuguesa que teve sua receita adaptada às características e ingredientes locais e são produzidas de forma artesanal.

O interesse dos turistas pela gastronomia pode ser usado pela atividade para estruturar seus bens e serviços beneficiando as comunidades locais, podendo ajudar a resgatar e/ou manter tradições antigas que estão a ponto de desaparecer. Como conseqüência desse interesse, a necessidade de valorizar o patrimônio gastronômico regional torna-se um dos pilares que fundamentam o desenvolvimento do turismo cultural.

De fato, través de sua dimensão social e cultural, a gastronomia foi possível ser incorporada as políticas de patrimônio cultural. A partir do uso turístico do patrimônio é possível fazer com que a gastronomia obtenha cada vez maior importância na promoção de um destino e para atrair um novo fluxo turístico.

Como patrimônio local, a gastronomia está sendo incorporada aos novos produtos turísticos destinados a determinados nichos de mercado, possibilitando a inserção de agentes da própria comunidade local na elaboração desses produtos, testemunhando o desenvolvimento sustentável da atividade.

É sempre bom pensar que nem todos os turistas são movidos exclusivamente pela cultura, alguns são em parte, entretanto, outros consideram como um elemento ligado a outra motivação principal. No entanto, podemos afirmar que na cidade de Aracaju, a gastronomia ainda não se configura como a principal agente motivador de um deslocamento turístico. Em geral, se busca a criação de rotas temáticas e culturais, em que se possam integrar em um único produto os elementos que na maioria das vezes isoladamente não despertam interesse ou que apresentam certa dificuldade de promoção e comercialização, podendo assim oferecer um produto final, que no todo, agrega valor, aumentando seus benefícios econômicos e sociais (SCHLUTER, 2003).

É certo que podemos afirmar que a demanda de turismo baseado nos produtos patrimoniais está crescendo a cada ano. Conseqüentemente, outros serviços que sempre foram comercializados de forma complementar ou inseridos nos tradicionais pacotes turísticos, a exemplo dos museus, o folclore, a gastronomia, música, entre outros, atualmente adquirem uma nova forma e se consolidam como principais elementos de atração turística.

Em todo o mundo, como já foi dito anteriormente, os grandes fluxos de turistas se motivam cada vez mais a conhecer o patrimônio cultural dos destinos visitados. Dentre estes patrimônios encontram-se inseridos os grandes mercados mundiais tais como: o Mercado Municipal Paulistano, Mercado Municipal de Curitiba, Mercado Modelo, em Salvador e o La Boqueria, em Barcelona. Tais equipamentos urbanos tornam-se atrativos para a atividade turística, uma vez que agregam, em sua maioria, em um único espaço, manifestações materiais e imateriais da identidade local. Entre estas manifestações as que mais se destacam são a gastronomia, arquitetura, agentes sociais (comerciantes e usuários), artesanato e os eventos culturais realizados no local.

Em Aracaju, os mercados centrais apresentam-se em dois planos de atratividade turística. Um primeiro plano material, representado por sua estrutura física. Em segundo plano, são encontradas verdadeiras manifestações culturais do povo sergipano, tais como a gastronomia, modos de fazer e o artesanato. Assim, o imaterial dá vida ao material, formando um conjunto que retrata a identidade do sergipano. Tais características fazem dos mercados municipais um dos maiores atrativos culturais da capital aracajuana.

Breve Apresentação dos Mercados Centrais de Aracaju

Aracaju, cidade projetada em meados do século XIX, possui um Centro Histórico representado por um conjunto arquitetônico de grande relevância para a identidade dos sergipanos. Esse conjunto urbano, constituído por equipamentos para usos de lazer, comércio e moradia foi, ao longo do tempo, construído e modificado, seja por processos que buscavam a sua revitalização e/ou atos de vandalismo.

Assim, dentre os equipamentos existentes no Centro Histórico, os Mercados Centrais de Aracaju é um conjunto composto por três mercados comerciais. Atualmente, estes mercados se configuram como um dos cartões postais da capital e também um atrativo turístico e cultural da mesma. Esse conjunto é formado pelo Mercado Antônio Franco, Mercado Auxiliar Thales Ferraz e Mercado Municipal Governador Albano Franco.

Estes mercados apresentam arquiteturas e construção de épocas distintas, além de possuir funções, usos e dinâmicas diferentes. O Mercado Antônio Franco, inaugurado no ano de 1926, possui estilo eclético, característicos da arquitetura existente em Aracaju na época. O prédio é formado por quatro faces que abriga um conjunto de lojas e no pátio interno localiza-se a torre do relógio. O Thales Ferraz, de 1949, foi construído para auxiliar o Antônio Franco, ele apresenta um estilo neocolonial, constituído por um grande pátio interno, arcadas e um alpendre (LIMA, 2010).

O Albano Franco, com construção concluída em 1998, possui uma estrutura baseada no modernismo, diferenciando-se dos demais. Em sua construção foram aproveitados os galpões abandonados do antigo Moinho Sergipe e o Armazém do Trigo.

A importância dos Mercados Centrais não se resume somente ao seu uso comercial, mas também a sua relevância para a identidade dos sergipanos. É a partir desse valor para a identidade sergipana e manifestação da mesma, que esses são considerados um ponto de visitação para os que residem e visitam Aracaju.

O Centro Histórico de Aracaju seguiu uma tendência mundial de esvaziamento e desvalorização dos centros históricos urbanos de grandes cidades que geram problemas de ordem ambiental e social. Até o final da década de 1990, a área dos mercados centrais, que na época era composta apenas pelos dois mercados Antônio Franco e Thales Ferraz, abrigava um grande número de pessoas, camelôs e comerciantes, que se espalhavam pelo entorno dos mercados, de forma desorganizada.

Naquela época, a comercialização de produtos era realizada nas ruas e calçadas do entorno, deixando os prédios dos mercados sem o devido uso. Essa ocupação desordenada dificultava o trânsito e a circulação de pedestres.

No âmbito social, Lima (2004) afirma que o processo de ‘empobrecimento’ sofrido pela área central de Aracaju teve no Mercado uma das facetas mais reveladoras. A presença de atores sociais marginalizados, como prostitutas, meninos ‘trombadinhas’ e ‘cheira-colas’, mendigos, entre outros, somados ao crescimento desenfreado do comercio informal, principalmente ao ocupar ruas e logradouros próximos, transformando-os indistintamente numa feira complexa e super adensada, tiveram influência decisiva no re-ordenamento sócio-espacial do Mercado Municipal.

Nesse estado de degradação ambiental e urbana foi implantado, na década de 1990, um projeto de revitalização dos mercados. Sobre esse processo Conceição et. al. (2010, p.166) afirmam que,

Os princípios de revitalização dos centros urbanos surgiram como respostas às ações de renovação urbana, que predominaram durante as décadas de 30 e 70 com o urbanismo moderno, cujo este defendia a destruição das áreas e dos edifícios habitados pela população marginalizada, sendo que posteriormente estes prédios reconstruídos para novos usos comerciais e de serviços.

Assim, o objetivo deste projeto era resgatar a paisagem urbana, a fim de recuperar as características arquitetônicas tradicionais da área para possibilitar a inserção da capital no processo de abertura ao mercado do turismo, bem como organizar o comércio existente, dando uma nova configuração a esse espaço urbano.

A partir daí, começaram as ações para a revitalização do Mercado Modelo Antônio Franco e do Auxiliar Thales Ferraz e posteriormente à revitalização foi construído o Mercado Albano Franco. A construção de um novo mercado foi uma estratégia de redistribuição e reorganização espacial do comércio. Assim, nos antigos mercados ficaram concentrados apenas os produtos locais, como artesanatos e comidas típicas e o novo foi utilizado para a comercialização de produtos básicos e alimentícios.

De acordo com Santos (2010), estas intervenções influenciaram no novo perfil paisagístico do centro histórico. Porém, é importante ressaltar que não conseguiram impor uma “nova” identidade, uma vez que não eliminaram seus usos anteriores, seja no que se refere à comercialização informal, atividade que sempre atuou como um ponto identitário para a área, ou nos territórios de prostituição que já estão consolidados neste espaço central.

Mercados Centrais de Aracaju e Suas Manifestações Gastronômicas

A gastronomia sergipana evoluiu a partir do intercâmbio de culturas alimentares africanas e indígenas e, devido a esse fator, está marcada por alimentos e condimentos característicos.

A partir do intercâmbio de especiarias entre os portugueses, africanos e indígenas foram introduzidos os condimentos como o cominho, a pimenta negra, a pimenta (conhecida na África como “piripiri”) e o sal que são utilizados com freqüência na gastronomia sergipana.

A influência dos indígenas é muito percebida devido ao forte consumo de raízes na gastronomia local, como por exemplo, a mandioca, batata doce e inhame. Sem dúvida, a mais importante dos três tipos citados é a mandioca, que se converteu em um produto básico na alimentação não somente dos sergipanos, mas de todos os nordestinos, uma vez que a partir desta raiz se extrai a farinha.

Paul Claval no seu livro sobre a geografia cultural disserta acerca da importância da mandioca como base da alimentação humana,

Ninguém afirmaria que a raiz de mandioca se converteria em uma das maiores bases da alimentação humana. A fécula extraída é tóxica devido ao ácido que contém. Este é eliminado através de diversas manipulações […]. A distância entre o produto bruto, perigoso, e o recurso alimentar essencial que se converteu é tão surpreendente que os mitos indianos se ampliam sobre a maneira como os deuses ensinaram aos homens o segredo do tratamento (CLAVAL, 2001, p. 256).

É importante ressaltar também a forte presença do milho na gastronomia sergipana. Os pratos elaborados a base do milho apresentam características peculiares e são comercializados em feiras públicas ou em restaurantes. Elaboram-se mingaus, biscoitos doces ou salgados, sobremesas, cuscuz e a canjica. O consumo da canjica está também relacionado com as festas Juninas, evento tradicional no Nordeste do Brasil.

Ademais destes exemplos já citados, não podemos esquecer o papel exercido pelos mariscos na gastronomia do estado de Sergipe. O estado é cortado por seis bacias hidrográficas e também é banhado pelo Oceano Atlântico, o que permite que Sergipe ofereça diversos pratos gastronômicos elaborados com distintos tipos de mariscos.

O conjunto arquitetônico formado pelos três mercados centrais representa uma síntese dos elementos presentes na gastronomia sergipana, onde são comercializados: mariscos, pescados, frutas, raízes, grãos, ervas, especiarias, frutas típicas e outros. Além das matérias-primas da gastronomia sergipana, são comercializados em lojas, bancas, restaurantes e lanchonetes que costumam oferecer pratos prontos, quitutes e compotas caseiras.

A representação gastronômica dos mercados é fruto das manifestações existentes no local. Tal conjunto comercial e cultural revela a identidade do povo sergipano, servindo como meio de interpretação da diversidade cultural e gastronomia sergipana através dos seus restaurantes, lanchonetes e quiosques, aliados ao artesanato, literatura de cordel e aos usuários que o concede vida, fazendo deste um local dinâmico pelos usos que lhe são atribuídos.

Cada um dos mercados possui aspectos próprios que os diferenciam uns dos outros, aspectos estes referentes à época de construção, suas funções, arquitetura e os serviços e bens prestados. O Mercado Antônio Franco apresenta uma arquitetura diferenciada dos outros dois mercados. Este possui um térreo, onde se encontra as lojas de artesanato e artigos diversos, um terraço, onde estão localizados três restaurantes e um posto policial estrategicamente localizado. De sua parte superior é possível ter uma visão panorâmica do rio Sergipe e da cidade da Barra dos Coqueiros. Dentre os serviços e bens comercializados no Antônio Franco, os restaurantes, bem como as lojas de artesanato e comidas típicas são os que mais se destacam (FOTO 1).

Foto 1: Vista aérea do Mercado Municipal Antônio Franco.

Foto: Sérgio Andrade.

Fonte:http://img295.imageshack.us/img295/5917/aa55io8.jpg

O Mercado Thales Ferraz, ou Mercado Auxiliar (denominação dada por sua função de auxiliar do mercado Antônio Franco), está localizado entre o Antônio Franco e a Praça de Eventos - praça que recebe um dos mais importantes eventos do estado, o Forró-Caju (FOTO 2).

Foto 2: Imagem área do Mercado Auxiliar Thales Ferraz.

Foto de Victor Balde.

Fonte: http://img48.imageshack.us/img48/1601/03ru9.jpg

Este mercado destaca-se pela comercialização de produtos naturais, ervas, condimentos, artesanato, derivados do leite, ingredientes para a elaboração de produtos típicos e quitutes da gastronomia sergipana a base de mandioca. Este mercado também abriga pequenos restaurantes e lanchonetes e conta com um posto de informações turísticas da EMSETUR (Empresa Sergipana de Turismo), localizado em seu interior, posto que tem como função auxiliar os visitantes, além de viabilizar uma melhor interpretação do local através da disponibilização de materiais impressos, tais como mapas e mini-guias.

Já o Mercado Municipal Governador Albano Franco, o maior entre os três, foi construído com a finalidade de ser o centro de abastecimento da capital (FOTO 3). De uso da população aracajuana, nele são comercializados: verduras, legumes, hortaliças, frutas das mais diversas, grãos, carnes, pescados e uma infinidade de alimentos e pequenas lanchonetes e restaurantes. Na parte superior localizam-se as lojas de confecção, artigos importados, calçados e brinquedos. Um dos grandes atrativos do Mercado Albano Franco é a variedade de mercadorias comercializadas no local. A diversidade de frutas, condimentos, farinhas, raízes e outros elementos que representam a gastronomia sergipana são de grande importância para quem quer conhecer parte da cultura sergipana, e também deve ser alvo dos gestores e profissionais de turismo para diversificar, de forma criativa, a oferta turística da cidade de Aracaju.

Foto 3: Imagem interna do Mercado Municipal Albano Franco.

Foto: Geane Almeida

Assim, os mercados centrais, como um grande atrativo turístico cultural de Aracaju, pelos seus muitos aspectos materiais e imateriais e manifestações gastronômicas, são lugares compostos de vida e de dinâmica que podem valorizar a experiência do turista. Com base na oferta potencial e real dos mercados é de grande importância que estes sejam trabalhados de forma racional, proporcionando o desenvolvimento social e econômico dos agentes envolvidos e o bem-estar da população aracajuana e de seus visitantes.

Considerações Finais

Através das pesquisas realizadas pode-se perceber que os Mercados Centrais de Aracaju são equipamentos urbanos utilizados tanto pelos residentes sergipanos como pelos turistas. Os primeiros utilizam desses espaços para abastecimento, comércio, lazer e compras. Os segundos utilizam como um espaço de lazer dentro da prática turística. É importante ressaltar que o uso desses equipamentos pela atividade turística se dá através das agências de receptivo que realizam passeios e city tours pela cidade.

É importante observar como se dá o uso turístico dos mercados e, a partir dessa observação, fazer as seguintes perguntas: será que o potencial turístico dos mercados é explorado de forma racional? Será que os comerciantes do local são beneficiados financeiramente pelo fluxo de turistas existente? Será que os turistas estão realmente conhecendo a cultura local?

Apesar de possuir uma grande quantidade e variedade de atrativos turísticos, o estado de Sergipe apresenta várias dificuldades para o desenvolvimento do turismo, dentre elas destacamos a diversidade e quantidade de roteiros e rotas turísticas comercializados. Tais dificuldades podem acarretar na insatisfação e/ou minimização da experiência dos turistas que visitam o território sergipano.

Não distante da realidade do estado, a capital Aracaju também enfrenta as mesmas dificuldades. Assim, faz-se necessário a busca por segmentos que complementem e inovem a oferta já existente na capital. O Centro Histórico, desde a sua revitalização, com seus conjuntos arquitetônicos e manifestações culturais, apresenta-se como uma saída para a diversificação e ampliação da oferta turística da capital.

Por isso, torna-se de fundamental importância que o estado de Sergipe, que ainda não se configura como um destino turístico consolidado desenvolva outros produtos para se diversificar e oferecer novas propostas com o objetivo de competir com os demais destinos turísticos.

Desta forma, acreditamos que, a elaboração de roteiros gastronômicos que incluam os Mercados Centrais possa integrar a gastronomia com outros produtos turísticos, a fim de construir um produto final que gere benefícios culturais, econômicos e sociais.

Diante dessas necessidades, os Mercados Centrais, pela sua importância para a identidade sergipana, não podem ser utilizados somente como mais um atrativo de city tours aracajuanos. É importante que os gestores e profissionais do turismo, através de equipes multidisciplinares, trabalhem o potencial do atrativo com criatividade e de maneira racional, pois no mercado turístico atual nota-se a necessidade de se trabalhar a partir do olhar do turista pós-moderno, que é um turista cada vez mais exigente, demanda esta que cresce a cada dia.

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SCHLUTER, Regina G. Gastronomia e Turismo. São Paulo: Aleph, 2003.



[1] Acadêmica do curso de Turismo da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: geane.almeida16@gmail.com

[2] Acadêmica do curso de Turismo da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: pinhorafaelly@gmail.com

[3] Doutoranda em Geografia Humana – Universidad de Barcelona. Professora assistente do curso de Turismo da Universidade Federal de Sergipe. E-mail: cristie09@uol.com.br

[4] UNESCO, Recomendación sobre la salvaguardia de la cultura tradicional y popular. Conferencia General en su 25ª sesión. Paris, 15 de noviembre de 1989.

[5] UNESCO. El primer anteproyecto de convención internacional para la salvaguardia del patrimonio inmaterial. CLT-2002/Conf. 203/3. Ano de las naciones unidas del patrimonio cultural. París, 26 de julio de 2002.

[6] Art. 1o Fica instituído o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro.

§ 1o Esse registro se fará em um dos seguintes livros:

I - Livro de Registro dos Saberes, onde serão inscritos conhecimentos e modos de fazer enraizados no cotidiano das comunidades;

II - Livro de Registro das Celebrações, onde serão inscritos rituais e festas que marcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade, do entretenimento e de outras práticas da vida social;

III - Livro de Registro das Formas de Expressão, onde serão inscritas manifestações literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas;

IV - Livro de Registro dos Lugares, onde serão inscritos mercados, feiras, santuários, praças e demais espaços onde se concentram e reproduzem práticas culturais coletivas.

[7] Art. 6o Ao Ministério da Cultura cabe assegurar ao bem registrado:

I - documentação por todos os meios técnicos admitidos, cabendo ao IPHAN manter banco de dados com o material produzido durante a instrução do processo.

II - ampla divulgação e promoção.

[...]

Art. 8o Fica instituído, no âmbito do Ministério da Cultura, o "Programa Nacional do Patrimônio Imaterial", visando à implementação de política específica de inventário, referenciamento e valorização desse patrimônio.